sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Count to 6 and die

Por que somos chamados de animais? Será que é porque vivemos por instintos? Você vive ou sobrevive?

Eu vejo meu reflexo na janela e ela parece diferente. Tão diferente do que você vê.

Uma promessa quebrada é tão boa quanto uma mentira. O inferno é enorme e o diabo está entre nós.
Se você quiser, venha e arranque isso de mim. Se acha que consegue, você ainda não me conhece. Deixa eu te contar: quando eu disse isso, eu disse pra valer.
O que você fará quando a guerra acabar? O que você fará quando o seu sistema falhar?
Suas palavras para mim são apenas sussurros [suas faces tão obscuras].
Eu tento prestar atenção mas suas palavras simplesmente desaparecem.
Lágrimas e vozes nervosas podem ser ouvidas por de trás da porta...
Luzes de rua desfiguradas...
Uma mente de pirâmide...

Tudo aumenta! Olhos queimam!
O tempo se sente como um passeio na madrugada...
Finalmente espera lá fora...
Chorando em braços perplexos...
Acariciando os seus sorrisos por dentro!
As pessoas não tem valor. A própria vida é apenas uma visão, um sonho. Nada existe. Apenas um espaço vazio e vocês. E vocês são melhores mortos!


*Comentário de hoje:


Religiosidade é um sintoma de crença irracional e esperança infundada.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

FRONTIÈRE - 2009


Sucessor de "Influences" (2005), "Frontière" traz uma banda amadurecida. 

"Esse disco é mais a cara da banda. O primeiro era o resultado do acúmulo de músicas que a gente ia fazendo, sem se preocupar com uma unidade", avalia o guitarrista Lucas Gurgel.

O hiato entre um disco e outro é justificado pelo baixista Felipe Ferreira, que faz sua estreia na banda com este disco: "No metal, o som precisa ser bem trabalhado, digerido, para fazer algo que o diferencie". 

O resultado desta maturação é que a inusitada escolha de produzir em três idiomas (português, inglês e francês) está melhor assentada na música da banda. O som dispensa adereços: é thrash metal feito a base do velho baixo-bateria-guitarra. 

Se destacam a pesadíssima "Abstratas demandas"; "Entr´acte", com solos de guitarra memoráveis";  "Mersault", com sua introdução arrastada e "Irruption" com uma introdução fudida. “ La Frontiere” e “Desir” destaco pelo Thrash pulsante com as pitadas do Death Metal.

Esse é o tipo de cd que se deve ouvir com a família toda junta na sala ou durante um churrasco com os amigos e amigas! 

*Link para download do cd: http://www.4shared.com/file/WqOnhei9/2009_Frontire_-_CLAMUS.html

domingo, 14 de novembro de 2010

Manuela e a Superfície Escondida

Manuela, quando tinha 13 anos e lhe cresceram as mamas, se lhe arredondaram as ancas e começou a sangrar "lá embaixo" uma vez por mês, assustou-se. Ao contrário de muitas das suas amigas, não desejava muito que aquilo acontecesse e tinha medo das consequências. Tudo aquilo lhe tinha sido já apresentado como misterioso, esquisito - coisas que simultaneamente caracterizavam as mulheres como específicas face aos homens, normais, e que ao mesmo tempo tornavam mulheres objeto de excessiva atenção. Já intuía que iria ser sobredefinida por essas características - objeto de espanto e escrutínio, o corpo feminino era objeto de desejo e predação. Aliás, já o era, desde que nascera: sobredefinida como do sexo feminino, antes mesmo de ser Manuela ou outra coisa qualquer. Prestava muita atenção aos seus irmãos e primos machos e achava que eles não tinham preocupações, e que ninguém se preocupava muito com eles. Eram livres de entrar e sair, quando faziam asneiras até lhes achavam piada, diziam asneiras sem serem reprimidos, corriam e jogavam à bola, e ainda tinham a liberdade para falar das moças como se fossem uma espécie de manada disponível para sua caça.

Um dia sem exemplo, os pais deixaram-na sozinha em casa, mas com a incubência de ir ao supermercado fazer as compras. Dirigiu-se ao roupeiro do quarto dos irmãos. Por cima das calças que trazia vestida, vestiu uma grande camisola e, por cima desta, colocou um blusão. Mal se viam as mamas. Como tinha o cabelo um pouco comprido, enrolou-o e colocou um gorro por cima. Não trazia maquiagem, pois ainda não lhe era permitido usá-la. Tão pouco tinha as unhas pintadas. Calçou um tênis. Planeou engrossar um pouco a voz. Controlou a ondulação das ancas, enfiou as mãos nos bolsos. Saiu à rua e foi ao supermercado. Pela primeira vez em semanas nenhum operário do prédio em construção à frente de sua casa lhe dirigiu um piropo.
Anos depois, Manuela ri-se a contar esta história. Terminou um curso universitário e tem um emprego decente. Juntou-se com um homem, conseguiuram comprar um casa, e há coisa de um ano teve uma filha. Ela não quer falar de um conjunto de coisas que a deprimem: de como no emprego não consegue subir na hierarquia porque tem conciliá-lo com a vida doméstica do que P.; de como não tem o jeito e o treino para fazer como os seus colegas masculinos, que parecem subir na hierarquia através de almoços e conversas, mais do que o trabalho. Não é dessas coisas que ela quer falar. Quer falar, isso sim, de como continua a achar o seu corpo uma coisa estranha. Ela quer que eu a compreenda: não está a dizer que se sente mal no seu corpo. O que quer dizer é que passou a vida a ouvir dizerem-lhe que seu corpo é algo de "estranho". O seu corpo mesmo e o seu corpo como representação. Teve sempre a sensação de que, quer fosse a mãe, quer os livros que lia, quer os médicos onde ia, quer ainda as revistas femininas, a publicidade, etc., o seu corpo era algo que precisava de ser explicado, que precisava de infinitos cuidados, especialistas, explicações, especulações: da menstruação ao útero, da gravidez às trompas, da cirurgia estética ao peso, do xampu aos pensos higiênicos, da forma de cruzar as pernas à roupa, das horas de saída aos sítios da cidade, tudo, mas tudo, parecia dizer ao mesmo tempo que ela era frágil e hiper-desejada - portanto, uma presa, como nos documentários da vida animal.

Tudo parecia dizer que ela era, antes de tudo o mais e mais que tudo - corpo. Ao mesmo tempo tudo parecia dizer que ela era menos: menos inteligente, menos forte, menos capaz de. Estúpida, portanto inferior. Emotiva, portanto inferior. Potencialmente histérica, isto é, dominada pelo útero. Como um preto, até certo ponto. Mas mais como uma preta. Também lhe diziam, de uma forma ou outra, que era perigosa, tentadora, que tinha poderes ocultos, que era a perdição de toda a gente e mais alguma. Frágil, infantil, estúpida, débil, mas perigosa, manhosa. Como um preto, pois. E sempre a precisa de ser explicada - por quem? Pelos homens, claro, que não tinham qualquer necessida ou vontade de se explicarem a si próprios.

Aos poucos foi pensando sobre o assunto. Não demorou muito a perceber que até há pouco tempo havia profissões que lhe estavam vedadas. Que não teria podido votar ou ter propriedade. Que anos atrás o marido teria uma autoridade total sobre ela. Que não poderia ter-se divorciado se as coisas ocorressem mal. Que teria sido uma parideira em série, sem contracepção. Um rol de horrores.  E tudo isso porquê? Certamente que não pelas mínimas diferenças do aspecto exterior em comparação com os homens - tão pequenas que se fossem grandes não era preciso serem tão constantemente exageradas, treinadas, ensinadas e vigiadas. Mas talvez por outros indícios da superfício do seu corpo, mais localizados e escondidos: os sinais diácriticos do seu corpo em relação ao corpo de um homem. Da categoria homem (ainda por cima confudida com a de Homem), a que se opõe a categoria a que pertence, mulher. Na sua vagina, prega escondida por oposição ao falo hasteado, a metáfora do seu "mistério". Para lá dela, lá no interior do seu corpo, o útero, caverna misteriosa. Onde acontece o quê? Bem, onde podem crescer os bebês - os bebês que lhe disseram ser seu destino natural desejar e ter; os bebês que até há bem pouco tempo eram do homem que fertilizasse os ovos no seu interior.

(Miguel Vale de Almeida - 2004)





Essa é uma das histórias do texto O Manifesto do Corpo de Miguel Vale de Almeida.

O texto todo foi escrito de forma displicente , sem nenhuma intenção de criticar e  discriminar. Para o autor,  certo e/ou errado é irrelevante. 

*Comentário de hoje:

Sina dos jovens: CORPINHO ESCULPIDO e CABECINHA DEFORMADA!